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Mostrando postagens de março, 2020

Pontual

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Desfazer. Esquecer. Imprimir teus olhos nos meus. Recriar o último adeus somente mais uma vez. Perder. Romper. Solicitar teus risos mais profundos. Partir. Modificar. Implorar um pedaço dos teus pedaços. Deixar. Transformar. Iludir teus nãos com os meus sins. Desculpar. Aceitar. Tentar acreditar em todas minhas negações falsas. Encontrar minha covardia. Expelir minha inquietação. Gostar cada dia um pouco mais de todo esse tremor. Jesline Cantos

O florescer de uma rosa qualquer

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Era botão. Se transformou, foi crescendo, crescendo até que não se conteve e transbordou ou desbrotou, pra usar o termo correto. De princípio sua pele delicada era fina ao ponto de se partir e despedaçar se toca-lá naquele instante. Pra tudo existe o tempo certo. A natureza que têm vida vem nos demonstrando isso ao longo dos tempos. É preciso esperar. Até que as pétalas mais maduras estejam firmes e entrelaçadas. Uma rosa é feita de muitas pétalas. Nós também somos assim, multifacetados, embora o "mundo cruel mundo se eu me chamasse Raimundo..." enfim, traga a desesperança de muitas formas. O que não conseguimos enxergar, talvez ainda não esteja revelado pra nós. Afinal a vida é cheia de artimanhas, desconfiem! Marília Machado

Para Lúcia

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Agora à noite gostaria de ser Lúcia Pois corre com leveza em espaços imaginários Saúda os dias já que a dor não a aniquila Ama as noites em que o corpo dança uma música a qual entorpece seus sentidos. Sabe que o tempo não passou para ela. Sonha com um lugar para si Caminha sem medo Tem a coragem daqueles que nada sabem. Porém, Lúcia O ser humano é um herói trágico Da morte não se escapa Do destino não se foge. Lúcia, Eu não sei para onde ir Chegando lá o que me espera sou eu Queria ficar em outro lugar, Ser você — Ser outra. Mas o que necessito é ir para qualquer lugar Para ser qualquer coisa que me é tramada. Amanhã não terei corpo ou possuirei Mas que coincidência, não sei porquê Lúcia, por que eu tenho medo? Sonhei que sabia aceitar meu destino Mas sou um bicho assustado Sou Antígona ou sou Ismene? É claro que Lúcia é a primeira Eu amaria ser Lúcia Ter o frescor da vida e vantagem de ser palpável. Jesline Cantos

O eterno domingo

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          Apesar da relatividade do tempo, é apenas racionalmente que ele se mostra como relativo. Ao contrário, na vida vivida, ele jamais o é. Ora fugaz, ora arrastado, quando se está em contato direto com o seu fluxo, o tempo sempre é absoluto naquilo que se mostra. Perceba que é tarefa impossível, num momento de alegria ou êxtase, termos em nossa mente a noção do quanto é indiferente o relógio e vagaroso o seu tic-tac; na mesma medida, também não acontece, em nenhuma hipótese, de o sofrimento sumir assim que se piscam os olhos, pois, quando ele nos acomete, sempre dá a impressão de que durará até mais tempo do que o próprio sofredor. Eis um exemplo, tão real quanto possível – pois é o que está acontecendo neste exato momento –, sobre como o tempo é absoluto e esmagador e sobre como as nossas convenções para entendê-lo não passam de cuidado paliativo para as angústias que ele nos força a sentir, e que são mais intensas quando se dão certas situações específicas. O caso é que agora

Pretérito Imperfeito

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"A palavra que mais gosto é liberdade. Gosto do som desta palavra." A vida corre que nem rio, é tudo tão efêmero... A vida é um piscar de olhos. Mas a água que corre entre nós é de renovação e nos transforma sem, muitas vezes, nem ao menos percebermos. É a criatura mais livre existente, o tempo. Mas ao contrário do que dizem, não é remédio pra tudo, ele só torna as coisas mais distantes, é como um instrumento que só pode ser bem utilizado se manuseado com cuidado por nós. Tendo assim consciência disso, que felicidade é essa transitoriedade! Vivemos assim então, buscando construir as memórias mais lindas e tocarmos muitos corações. Esperando que nós como pessoas possamos nos olhar nos olhos, trocar sorrisos e ideias, encher a boca e os atos de rebeldia. A vida, por fim, é quando uma moça bonita olha pela janela, cercada de amigos, inventando, descobrindo, apoiando, compartilhando e fazendo o que por sinal podemos chamar de a própria Vida! Marília Machado

A horta

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          Acho graça isso de mergulhar nas palavras. Palavras são só palavras; assim como, estrelas são só estrelas; os dias são só os dias. Passando um após o outro. Brincando de revezar com a noite. Tudo o que acontece no meio desse balaio, é significado. Ou a significância que se abriga no tempo, por assim dizer. Às vezes sinto que careço de imaginação, outras vezes, de fé. Essa maneira de existir, de construir paredes não muito sólidas, pois é necessário, de tempos em tempos, desabar. É preciso quebrar, juntar, construir e usar sempre do mesmo material em todo o processo, desde o princípio. Só que cansa, é um trabalho exaustivo e se sigo é porque ainda não consegui caminhar com outro sentido. Às vezes também, isso se confunde à minha própria existência. É um mistério que se coloca diante de mim. Da forma sei, só sei, que detesto ideia fixa. Marília Santos Machado

O fim quando chega cabe em qualquer lugar

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          Não apenas as pessoas que vivem e que morrem possuem um fim, mas os lugares também. Cronos é pai tanto dos viventes quanto das localidades, e os destinos de todos os seus filhos é sempre o mesmo. Eu, no meu caso, ainda continuarei aqui por mais não sei quanto tempo e, sinceramente, espero que por muito mais. Porém, ainda que tal desejo se realize e que a minha existência ecoe pelos séculos, tenho amiúde vivido o meu fim desde que nasci. Já experimentei o meu desfecho de muitas formas, já virei passado para tanta gente.           A tudo o ser humano se habitua. O acostumar-se permite que ele conviva até mesmo com o que há de mais detestável na vida. Essa característica, à primeira vista, parece ser uma habilidade proveitosa para a sua sobrevivência, já que em muitos momentos é preciso que ele se resigne frente a adversidades. Porém, ao tirar-se conclusões tão depressa, corre-se o risco de cair na armadilha da existência habituada. Deixar a vida transformar-se totalmente

O misantropo

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O existir é a maior das vaidades. Ninguém jamais poderia permitir a si próprio ou aos outros tal espécie de luxo sem sentido. Qualquer sujeito que queira ultrapassar a própria existência empregando-a algum significado monumental será forçado a encarar, ao menos uma vez na vida – quase sempre diante da face da morte – a crueza viva das coisas que são e que se recusam a aceitar nossas sentenças sobre elas. Tudo existe em demasia, consegue entender? O vento nascido no ventilador que morre prematuramente em meu rosto move-se apenas o suficiente para anunciar que ele também existe. Sinto-o a deslizar amigavelmente pelos meus cabelos que balançam no ritmo da sua existência, avisando-me que também existo. O chão frio tocando os meus pés cria um contraste com o calor sufocante do ar justamente para não me deixar esquecer de que tudo isso existe. Quando ingenuamente penso ter encontrado o vácuo entre eu e o mundo, um vácuo de nada, onde eu poderia repousar meu corpo cansado, observo-o ser rap

Por que vens tão tarde?

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Por que vens tão tarde? descosturo os nós no meu peito e do todo sou uma esperança já morta um último suspiro de um pássaro lento no instante Por que vens e nada é o que já foi? seguro meus dedos e arranco as últimas farpas marca de um eu que ainda insiste Disse-te um dia ama-me que assim te sonho e de tudo sou um pássaro que sabe da chuva que vem exceto que ela não vem mais Cubro-me de um destino que dorme não sonha, mulher inaugurado o instante já morreu e o agora é o mistério mais solene Jesline Cantos