Os Olhos

 Incerto dia me diz o velho no porto:


"Afrouxar dos olhos as rédeas, meu jovem
Deixar o olhar se ir
De perto mirar glórias e tragédias
Viver é sempre chorar e sorrir".

E continuou, semblante de morto:

"Nada mais objetificante
Do que olhos colados em ti diretamente
Nada mais aterrorizante
Do que os teus cerrados para sempre".

Questionei-o ansioso por conforto:

"Velho, qual desses sentidos é sincero
Olhos do sim ou olhos do não?
Podem ser tomados a sério
Olhares com tamanha obtusão?"

Refletiu e lançou-me olhar torto:

Só com a vista me respondeu
Que com olhos não se joga
Por eles foi ofendido e ofendeu
E através deles ainda chora

Então, se sumiu a pé o velho do porto:

O segui até o longe com a vista
E depois nunca mais o vi
Em alhures, neste chão sulista
Para outrem com os olhos sorri

Já hoje me apanho absorto:

É que tu viste a mim te vendo
E me recordo da reflexão que o velho me deu
Os nossos olhos estão se compreendendo?
Sinto essa mesma dúvida pairando sobre os teus... 

                                                  Erik Rosa



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