Amor de moral
O que é o amor?
É o que leio nos livros?
Ouço nos discos? Vejo nos filmes?
É o que está na boca do povo?
O amor ideal? Amor da moral?
O que é, então, o amor, se não o sinto?
A não ser como um sufocante cinto
Como uma eterna espera pelo amanhã
Que, em sua fugacidade, nunca vem
Pois o amor é coisa do depois.
O que é esse amor
Que em sua própria origem quimérica
Não se permite a existência?
Do amor definido pela falta quero a lonjura
Que não encarda à noite os meus sonhos
Não modifique as minhas já fragmentadas lembranças
Que amiúde tenha a dignidade
De bater à porta quando cogitar se adentrar
Para que eu calmamente saia pelos fundos
E o deixe plantado, prostrado
Assim como eu:
Só, abstrato, hipotético
"Chorando feito fogo à luz do Sol".
Esse amor que é "ídolo" - uma palavra
Por não se achar na vida não a conhece
Não recorda e tampouco se esquece
Não é e não virá-a-ser
Vazio que é, não pulsa - não morre.
Me desagrada a debochada infinitude desse amor
Prefiro a flor que nasce e o dia que perece
Pois se vêm e se vão comigo
Me afeiçoo ao que transita e se conflita
Não ao que se iguala a si mesmo - o amor.
Amor febril, moderno, amor fabril
Do homem cansado de si
Arrebatado e feito adolescente
A esse amor não tenho obséquios a pedir
Pois nem o Nada ele pode me dar
Mesmo anunciando o Infinito com sublimes beijos
Recuso-o: sei que não se pode oferecer o indizível
E que não carrega bulhufas neste embrulho - promessas
Nego-o para afirmar-me com um Sim a mim mesmo
Afirmar com um Sim a você que (me) lê
Para dizer Sim ao mundo.
E se ainda, veja bem, me implorassem para que eu ame
Eu amaria. Mas com um Amor-Sim de um
segundo...
Erik Rosa
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